21.5.11

Antônio Almeida, o inço das artes no Maranhão

Como planta daninha que se agarra despretensiosamente ao solo modificando a paisagem natural saiu do Jacaré, em Barra do Corda, desbravando caminhos até alcançar São Luís, onde denunciou sua vida e a de milhares de famílias do interior do Maranhão sem deixar escapar o amarelo que queimava o verde e secava o azul, o colorido da cultura e a palidez do sofrimento que lavrava a terra árida de fome e seca por onde passava.

Do chão infecundo, fez brotar arte. Nunca aceitou sair de sua terra para viver uma cultura solitária avessa a sua natureza de homem simples. Suas mãos colhiam da natureza inspiração como raízes que buscam no âmago da terra os nutrientes necessários à sobrevivência. Indiferente ao dinheiro, o enriquecimento que desejava era intelectual e artístico, trabalhava pelo valor que a arte tinha pra si mesmo: a busca pela perfeição, no entanto, com ela pagava o leite e a boemia: nutria seus dez filhos, e quando dava, rematava a conta do bar.

Sobrevivente da seca castigado pelo sol, a escuridão tomou conta de seus dias. As madrugadas, companheiras de insônia, ouviam-no em silêncio, enquanto travava discussões com seus próprios pensamentos. No dia seguinte... prosas e poesias com o cheiro de terra através do olhar de um menino autodidata de nascença que crescera sob instrução de seus instintos, mas, sobretudo, de um artista nervoso que desafiou até a cegueira tateando pensamentos e redesenhando palavras, sementes essas lançadas no chão fértil de suas limitações criativas, esse era o Almeida: uma raiz amarga difícil de ser tragada, mas que se ramificava.

Aos 27 de maio deste ano completaria 89 anos, se não tivesse sido desentranhado da terra em Janeiro de 2009, a facão! Sua sede de viver era tamanha que teimou com a vida agarrando-se a cada sopro dos ventos até o silêncio pintar o leito de paz. Hoje, suas estirpes ainda permanecem entranhadas na terra que amou, ilustrou, pintou, xilografou... verdadeiras barrigudeiras espalhadas pela cidade, murais que deveriam ser tombados pelo valor histórico e cultural, testemunhas sol a sol do caminhar de um homem franzino e inquieto que germinou arte no Maranhão.

Alice Almeida Nascimento dos Reis


Há muitos anos atrás, eu e meu avô, em sua casa no Monte Castelo, guardiã de seus dias de vida

Quase Epitáfio
No meio do caminho que caminho
a cova
Em que me planto regermino sonho
Que é vida sempre sol a sol a caminhar
Antônio Almeida
( 1922-2009)



17 comentários:

  1. Não conheço nada sobre o Antônio Almeida, mas esse texto me está fazendo ir percorrer o Google em busca de mais! Grato por isso.

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  2. Fred Caju, como vai?

    Infelizmente acho pouco provável que encontre grandes informações sobre esse pintor semi analfabeto de grande genialidade, como citou Darcy Ribeiro em seu livro Viagem ao Xingu. O Maranhão perdeu seu contato humano, e hoje familiares, amigos, admiradores nos unimos em manifesto pela conservação e quem sabe, tombamento de muitas de suas obras abandonadas pela cidade. Caso tenha Facebook, participe dessa manifestação, sinta-se convidado a conhecê-lo sob meu olhar e sob sua própria arte e palavras.

    acesse: http://www.facebook.com/event.php?eid=213200585367481

    Obrigada pelo carinho.Conto contigo!

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  3. Oi Lika...seu texto é uma homenagm...dá para sentir em suas palavras e no seu sorriso aí, o tamanho da admiração, do respeito, do amor e da cumplicidade que a convivência concedeu a vocês
    ficou estampado o tamanho do orgulho

    Achei muito bonito isso...

    Quase Epitáfio
    No meio do caminho que caminho
    a cova
    Em que me planto regermino sonho
    Que é vida sempre sol a sol a caminhar

    Antônio Almeida

    Um abraço na alma...bom domingo pra vocês com muitas boas lembranças do artista, do homem...do avô Antonio Almeida

    Beijo

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  4. Élcio, Antônio Almeida era um homem de sensibilidade extraordinária! Impossível não admirá-lo! Quase Epitáfio, foi criado por ele para sua lápide. Escreveu momentos antes de falecer!

    Me emociono muito!
    grande abraço

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  5. Olá

    Quem vive
    com o coração entende,
    que em algum lugar
    onde a vida
    continue,
    suas ideias
    vencerão o tempo.

    Que as estrelas
    sempre brilhem em teu olhar.

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  6. Oi Lika...

    Seu avô merece mesmo ser homenageado...era um artista e tanto...
    Quase Epitáfio me lembrou um poema da Dona Elza aqui...chama-se Ultimo Alento...´o que mais gosto apesar de ser um pouco triste, ou muito triste, pois fala da partida dela que espero ainda estar muito longe
    Vai fundo Lika...essa entrevista com o Zeca Baleiro é escrita ou gravada? Deve ter sido super interessante
    Boa quarta...um abraço na alma
    Beijo

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  7. Aluísio, obrigada pelas palavras ternas e participação.
    Élcio...é mais que uma homenagem, é denúncia também contra o descaso de seus trabalhos por parte do governo. Ele teve a oportunidade, ainda jovem, ( o que muitos artistas fazem atualmente) de sair de São Luís e estudar arte na França, mas se recusou, porque n abandonaria sua terra. E hoje a terra parece o abandonar!

    Sobre a entrevista a Zeca Baleiro, isso fez parte de um documentário que o Zeca estaria organizando, mas não foi divulgado ainda, e foi filmada. Lembro-me que o clima era muito descontraído, muitas risadas... palavras soltas, expressões do conhecimento de ambos...foi um dia belíssimo!!!

    Então vamos em frente!!!

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  8. Querida Lika... Li a respeito do seu avó! Está explicado esse dom maravilhoso que você possui é hereditário! Conte comigo para manter viva a memória e a arte desse grande artista!

    __________________________

    Você faz parte da alegria que eu estou sentindo... Por essa razão conto com a sua presença em meu blog, participando do sorteio que será realizado!
    Sinta-se carinhosamente abraçada.

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  9. Anônimo26.5.11

    Quem teve a felicidade e o privilégio de conhecer Antonio Almeida pôde vislumbrar um homem simples, mas ao mesmo tempo grandioso, de alma nobre, com uma vontade intensa de viver, de criar, onde a todo o momento as ideias pareciam efervescerem em sua mente, tão inquieta quanto a sua, Alice.
    Alvaro

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  10. Com certeza...toda essa mobilização vai muito além de uma homenagem...algumas pessoas (digo as do governo, no cado a secretaria de cultura, assim imagino) tem que ser mesmo sensibilizadas para que tomem consciência do valor artistico e histórico de tudo que foi deixado pelo seu avô e assim seja preservada toda a sua obra...mais que isso, para que continue sendo compatilhada com todos... e acredito que isso vá ser feito
    Quanto a entrevista...imagino o quanto interessante deve ter sido...duas grações, cada um com suas expressões, impressões sobre a vida...mais um documento histórico...
    Um abraço na alma...vai fundo...passo a passo...este é o caminho...

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  11. ALvaro, meu querido, é verdade! Embora nosso "Tempo" de convivência com ele tenha sido esporádico, foram sempre intensos. A vontade de viver é o seu maior legado que se expressa em sua arte! Grande bj

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  12. Elcio, é o que esperamos, não só da secretaria de cultura, como turismo, vez que as obras também são cartões postais da cidade.

    Obrigada pela força!!!

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  13. Anônimo27.5.11

    Ouvi seu nome na rádio no programa de Hans, e a encontrei pelo twitter dele. Cresci indo comprar jornal nas bancas da praça joão lisboa, nas tardes de domingo e ficava imaginando como alguém conseguiu fazer aquela arte daquele tamanho. E hoje me entrsiteço, porque levo meus filhos no mesmo lugar, na mesma banca e mostro o trabalho do seu avô, para que não se percam com tanta tecnologia sem viver o passado e presente.
    Fico feliz em saber que há pessoas, como você que estão buscando preservar nossa memória!

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  14. Anônimo27.5.11

    Sou amante dos esportes, assim como das artes, ao ouvir sobre o seu manifesto, na radio 99 FM, no programa canto das torcidas, fico indignado com o descaso do poder publico com o patrimônio da nossa terra, dentre eles o seu avô, Antonio Almeida, que com suas obras nos mostra a simplicidade e a beleza da nossa gente.
    Mauro.

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  15. são as plantas daninhas as que não danam,pois são danadas, estão danadas por justiças gerais, pois isso são bravas, intratáveis, fortes, agresstes, resistentes,porque exigem liberdade, espaços, coletividades.
    belo texto,
    b
    l

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  16. Sobre o painel em azulejo do antigo Banco do Estado do Maranhão, na verdade a obra foi impressa em azulejo... imaginem o que significaria uma restauração?!Mas a arte é cartão postal da cidade e merece atenção devida!

    Agradeço a rádio cidade e a Hans pelo espaço e apoio de todos vocês!

    Obrigada

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  17. Luis Eustáquio, Almeida viveu até o último suspiro, homem franzino e forte. Quero crer que seus trabalhos são suas sementes!
    Obrigada pelas palavras!!! Adorei!

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